quarta-feira, novembro 28, 2012

Lua Cheia





toca a minha boca
em lua
enquanto te construo
palavras
ritos
mordidas

o que é de mim
é verbo
desejo formado
embebido em teu hálito

porque o que é meu
nem vai
nem fica

colore a língua
acalma a partida


e chamusca
a pele lambida
em fases.

quinta-feira, novembro 22, 2012

Grito




porque o abraço
tem a dimensão
da distância

e a minha boca
a tua ausência

porque a palavra
desenha palco
quando o teu nome

engasga no peito.

Dira Vieira

domingo, novembro 11, 2012


Sussurro

troco as minhas pernas
pelas tuas
carícias de almodóvar
por baixo da mesa

e
a língua
(incansável discurso no ouvido)

é a palavra que veste
a minha pele de Braille.

Dira Vieira

quinta-feira, novembro 08, 2012




Paisagem

O pulso ainda toca
e o peito se enche da última hora
o que é eternidade se espalha e se mistura no ar

o que tem de mim
marca o narciso na alma



(e uma dor se mistura com o que sou)

o que sobra
desenha na aurora uma boca ávida

de lágrimas 

(o que sou tem em tua boca a tradução dos abismos)

tenho de mim todas as sedes de ti
e um dia nublado pra mastigar 

silenciosamente

como quem toca o outro lado
de todos os contrários.

(Dira Vieira)

domingo, outubro 14, 2012

Tatuando desejos




não compro os abismos, eles estão em tua fala doce que se esconde entre os acordes desse desejo noturno. não compro os riscos, eles vem na moldura que a tua língua traça toda vez que ensaia o meu nome. tenho todas as letras e o teu nome talhado em mim em esfinge em um domingo à noite, duro de engolir.

o teu amor
tomou a minha corrente sanguínea
e me entornou
em contrastes.

sexta-feira, setembro 14, 2012

Bebendo de suas ausências





Até que um dia eu possa conter as suas lágrimas em minhas mãos e possa-as beber como alimento do meu imenso amor por você. Porque o meu amor é como paisagem que lhe calça o longe, plantando flores para que o seu caminho seja mais perfumado 
e plantando luz para que onde passes todo o universo se molde para acolher a sua alma. Porque o meu amor pedirá a Deus todos os dias para que o seu sorriso seja perpétuo e a tua saúde seja o que mais lhe aproxime do amor de Deus.

E que eu nunca mais eu lhe diga o quanto o amo, porque dessa forma, diminuiria as estrelas no céu por cada vez que pronunciasse o seu nome em vão...

porque na verdade eu nem mais amo... sou-me misturada à sua pele e sentidos. porque a gaiola já nem existe e o meu corpo se estende como paisagem para receber a sua respiração quando tudo o mais lá fora for pesado demais para as tuas asas...

sexta-feira, agosto 17, 2012

sozinha

não acredito mais em nada. eu me sinto só e isso já dói suficiente por hoje.

domingo, agosto 12, 2012

silêncio


só quando se está triste
demasiadamente

é possível
interpretar o silêncio

[e a culpa]

a dor
vem em ondas digitais

e se acomoda no ventre da indiferença.

toda palavra torta
se comprime
e o amor resseca sobre a mesa

sou verso
em cada lágrima que bebo

com o nome
e
dentro
dele.

Dira

quando o sono não vem



e se eu conseguisse...
era essa noite
que
de uma vez
eu
te
derramaria de mim

até
secar...

Dira

sábado, agosto 11, 2012


Eu não sei dançar, anjo

"...e tudo o que posso te dar é solidão com vista pro mar..."


não queria mais esperar que a noite chegasse. queria-o imediatamente, pois a sua espera se tornara uma dor quase insuportável de sentir. sentia falta de falar menos e olhá-lo com todos os seus olhos de quereres muito, de quereres tudo. 

[quando o viu com aqueles olhos cobertos pela barba farta, Madalena era a menina apaixonada e o moço inatingível de se ver... ela esperaria a eternidade por ele...]

sentia-se colada nele, dentro dele, mas dentro sozinha... não queria ser o anjo dele mas tocá-lo em suas asas, como uma fêmea aflita de desejos que incendiavam os seus passos e pensamentos. 

madalena carrega fomes e as suas garras afiadas, são delicadas o suficiente para respeitar o tempo dele. mas esperar o que não vem dói como um punhal que se crava no peito, sem que ninguém ouse arrancar...

nunca foi de jogos, de simulações e nem de armações. madalena é o fogo aceso em tempo integral... ela mesma se acende e se apaga, porque não sobrevive à indiferença e à humilhação e quando se abandona, até que tenta morrer... mas sempre acredito que nasça todos os dias e idas.

o tempo dele era um tempo de nunca. e quanto mais madalena o desejava, mas a sua alma se unia a dele inutilmente, porque o corpo dela era a ironia do desejo que se reparte em faces e o olha lascivamente como quem cobiça a fruta mais doce, a mais pura...

[em alguns momentos, madalena o ama como quem faz uma oração de desespero... pedindo a Deus a liberdade de amar tão intensamente que a isola do mundo e mergulha em lágrimas...]

não era tão inocente o que sentia por ele... pele e pêlos que se mudavam de lugar toda vez que mencionava o seu nome... pele e pêlos que se traduziam em rubores toda vez que sozinha, tentava expulsá-lo de sua mente, mas o que sentia era a pele acender e a sua mente se mudava para o corpo dele, base segura, onde os seus braços necessitavam morrer.

enquanto o anjo se vai, madalena se deixa desenhar em outra nuvem... mas quando a noite cai e ele acena de seus voos sempre e sempre solitários, madalena é dor que sangra e lateja... e implora uma volta que não é atendida nunca...

madalena é idiota. as vezes eu a odeio. aliás, a odeio sempre. não existem anjos. porque a falta de materialização cansa de nunca reproduzir o próprio gozo.

madalena é idiota. as vezes eu a odeio. aliás, a odeio sempre, porque sempre mergulha onde o chão é areia movediça e o onde o sofrimento se vê de longe.

no dia de hoje eu desejaria a morte para madalena e um asilo para mim, porque amar sozinha é como morrer sangrando gota a gota... até a morte fingir tapete vermelho e fingir te alegrar...

Dira

terça-feira, agosto 07, 2012



O AMOR É MERGULHO NO INCERTO


Desconfio dos relacionamentos de baixo envolvimento. A ideia de "desapego" ainda não me convenceu. 

Desapego-me de objetos, de coisas, de produtos da mão do homem, mas nunca de pessoas. Ao contrário, costumo mergulhar nelas como alternativa contra o isolamento e a morte de mim mesma. Eu mergulho no outro, em uma tentativa desesperada de sobreviver.

Preciso de pessoas, preciso dar e receber afeto. Sou feita de sorrisos, de paixões, de riscos. A minha pele se molda no desconhecido, se adapta ao calor e colo que me afaga. Não dou à mínima aos rituais sociais. As obrigações de ser e ter amigos. Eu me moldo ao afeto que me cativa, que me seduz, que me ganha quando isso não tem nenhuma implicação de deveres e de favores.

Se eu digo que amo, estou dizendo eu preciso de você e não necessariamente que essa declaração tenha uma conotação sexual, amorosa, ou outro qualquer rótulo que se queira supor em uma tentativa de categorizar os sentimentos.

Sim. Nunca consigo sair ilesa das minhas relações humanas. Há sempre o conflito. O amar demais, o medo do outro, o estranho, o estrangeiro, o exótico, o que não se entende. Mas principalmente, me ressinto de mergulhar sozinha, ou muito bem acompanhada e de lá, sair aos pedaços, ou quase sem fôlego porque o outro, não suportou a profundidade e subiu para respirar.

Quando alguém me diz que não crer no amor após cativar de mim todas as declarações de apego mais profundas me agride profundamente. Porque nunca confundo educação com amor. Eu sei bem a diferença de ser educado e de ser encantado. Se eu fosse me apaixonar, ou mergulhar em todos que me são educados, seria uma catástrofe. Toleramos a todos, amamos os que nos cativam. Não vou ser hipócrita de dizer que amo a todos, mas mergulho onde o mar é convite ao encantamento. A minha alma se molda onde o afeto é pele e onde a pele salta em contato com o olhar do outro.

Eu não cuido dos outros, eu amo. Eu não sou mãe de meus filhos, nem dos meus netos, nem dos amigos, nem  dos amores...sou mãe de minha fome do outro. É no outro onde me alimento, como vampiro que depende da sedução e do sangue fresco.

Nunca saio impunemente de minhas relações pessoais...sempre saio dolorida, sempre machuco, sempre sou machucada. Porque todo mergulho me leva por inteira e eu não consigo viver nas superfícies das amizades comportadinhas, superficiais e carregadas de segundas intenções. Não desejo o que é do outro, mas desejo sempre  e sempre o outro por completo dentro de mim. Não há outra forma de ser amigo...  por isso que me classifico o tempo inteiro como um ET, um ser completamente fora de mim.

Toda relação humana ou animal, leva de mim apenas o tudo, e quando ela acaba, me deixa assim, como se eu não tivesse mais casa, ou como se o outro, tivesse levado de mim o que nunca foi meu, o amor que de mim se doa e se perde nessa troca da imensidão do outro.

Eu amo, louca e desesperadamente assim... e isso me será imputado para a morte como quem se culpa de ser humana, demasiadamente humana, ou extraterrestre. 

Dira

domingo, agosto 05, 2012



[...] e quando a noite cai tudo o que você queria era ter o abraço dele e o sentimento de que estar por perto é todo o seu maior tesouro. 


cansada de perder... tudo o que eu mais queria era virar borboleta e sumir por ai.

segunda-feira, julho 30, 2012



entrelaçados


"...meus pés ainda sonham o teu chão..." (Astier Basílio, Sal de Prata)


esperando os dias
as palavras
e o entrelaçamento de minha esperança na tua.

esperando as palavras
e os dias
e nossas bocas se entrelaçando na rua.

Dira

sexta-feira, julho 27, 2012


FRUTA MADURA




Imagem de Célio Diniz


Como água para chocolate assim o amor se derrama onde encontra afago e proteção. É assim que Madalena se derrama sobre a paisagem, abrindo o mote sobre as nuvens e nomeando as palavras compassadamente uma a uma sobre o que sente... o que é meu é teu, e o que é teu tem a tradução do meu olhar sobre o infinito e o teu olhar perdido que grita quando eu nem sei o que fazer. Entrelaçados nos marcamos nessas linhas no olhar que se molda na simplicidade do estar junto quando a noite se cala
 .
Não é preciso muito para dizer o quanto sou o dentro e no entorno...

... e por mais que me esquive e voe... e por mais que resista e nomeie as fotografias, serás sempre a minha melhor imagem tatuada na boca, hálito que descreve o teu gosto.

Porque tudo o que há em mim tem a sua mão moldando o meu sonho... e por mais que voe longe, a porta se fecha em contrário e me atrai no casulo para bem perto de ti. Os sonhos eu nem herdo, traço-os a mão como quem muda o mundo.

E se isso é o que me resta dessa vida... adorno a vontade e fico quietinha traduzindo a voz cortada, a vontade sufocada e o amor imenso que trago por ti.

Como água para o chocolate o teu afeto é desejo derramado sobre a boca salivando a esperança... enquanto formos antigos... e, assim, no querer, sempre haverá quem traduza que o simples ganhará o mundo e salvará a própria pele...

Fruta madura é a saudade... e o que vai ficar é o que ganhamos da vida... afeto que se derrama em tua pele morna, fruta madura ainda no pé.

Porque o amor tem sete chaves e o que me abre tem o formato da sua boca... quando o dia se enfada das 24 horas e pede o descanso do merecido sonho...

Não é o dom que me move... é amor que me desenha em sementes e pétalas.

[... porque em mim o que grita é o que me calas... e o que imploro é tempestade sobre nós até que essa fome acabe e esse silêncio nos salve...]

Dira Vieira

domingo, julho 08, 2012


Canta pra mim, anjo...



inscrevi em teus olhos em uma cena em contrário quando o cenário estava completamente tomado por objetos que desafiavam a gravidade. eu levitava em suas mãos... sem ao sentir o teu toque...

eu me vi deitada sobre a tua iris, a mão pousada sobre a tua pele desenhando um quadro impressionista. era azul a tua fala e eu te ouvia sussurrar o meu nome quase em música.

essa não era a música que pedi para nós dois. toque outra, tempo. cante outra, vento. mas não machuque mais essa pele que já não acredita que o amor pode ser assim tão inocente quanto as palavras que disse a ele e ele nem deu atenção.

fotografe a minha saudade, anjo, quando os dias se contam em minutos desenhados na parede e eu tenho quase certeza que são poucos, finais de um tempo fino e pausado. posso sentir em minhas mãos o hálito amparado pelo teu não antes que me tocasse a alma.

ainda não é o tempo, meu anjo. ainda não, mas ele não tarda e logo virá em que eu não precisarei mais de licença e nem códigos para te desejar com a minha alma e as minhas mãos.

eu penso em você o tempo inteiro e sonho, anjo... e quando não me restar mais as lembranças inventarei outras tantas, mágicas, quantas e te criarei em vime, trocas, silêncios, até que o meu desejos seja a materialização desse amor imenso em que eu teço em rendas e apetrechos nessa viagem... talvez sem volta.
chore as minhas lágrimas, anjo. beba-as com a minha sede tanta de teus olhos em mim e o teu cuidado me arrumando um lugar para deitar a minha cabeça quando os meus olhos já houverem chorado o tudo. porque em mim a tua ausência é um balde seco diante de um mar de águas quase insuportável de beber porque já não há choro suficiente para te conter em mim, mar de anjo e palavras...

canta em mim, anjo, como quem arruma a cama para deitar enquanto a lua cheia entra sem piedade pela janela do quarto chorou enquanto arrumava a cama para deitar sua dor. ensaiou carícias que poderia ser na pele dele... pensou no que sonharia naquela noite, mas não conseguia parar de chorar e de sentir a frieza de apenas algumas horas sem ti.

eu já nem tenho asas, anjo, porque enquanto as deixo abertas é para ensinar aos outros que se aproximam que quando se prende se mata a borboleta em nós. nunca ensinei ninguém a ficar, anjo, por isso vivo só, asas abertas e pensamento longe. ali perto, em ti.

fica em mim, anjo quando não for mais possível ir embora sem me levar em ti... para sempre.  

*Imagem criada por Nilton Dias. 

sábado, junho 16, 2012



Tire-me pra dançar, anjo


deixei a voz presa enquanto pensava o teu nome. era um pássaro com asa dentro da minha blusa enquanto balbuciava a esperança. os seus dedos em penas sobrevoavam a minha pele de fêmea, mas era Madalena quem suspirava e não eu, que a tudo resistia melancolicamente. não podia voltar àquele tempo em que fui tua. a menina doce, a mulher afoita e a Madalena que adormecia silenciosamente entre as tuas asas.

enquanto falavas no altar, a menina sonhava e enrubescia com a memória de silêncio e de odores que se faziam asas em páginas e páginas em que te escrevia como em gritos.
não volto mais ao portão e o cachorro que latia quando a noite se tornava tarde, agora jaz em alguma lembrança minha ou sua. não resolvemos ainda essa parte da vida?

Madalena levantou após a fala, mas não tinha o rubor facial que merecia aquela memória, ao contrário, ardia em pêlos e sentia a tua pele levantar a alma da menina que guardava em si, e isso era pecado mortal.

(eu tenho medo de tuas dúvidas, porque tenho medo de te perder...
não brinca de achar o que estou pensando ou o que não estou, porque em mim, as únicas fogueiras que queimam é as de uma inquisição particular e íntima).

e mesmo que o meu amor seja bem maior que o seu, a fala é a minha retirada de cena, quando o que me resta é arrumar as malas dentro de nós e pegar a estrada antes que a noite me desnude.

sufoco em mim o rubor facial quando o teu olhar me tira a pele e me chama para dançar, assim, completamente à luz, aos olhos dos que não entenderão nunca o que acontece quando  as almas dizem sim.

domingo, abril 22, 2012

O tempo é só

As vezes fico em duvida se uso a Madalena ou se abro o verbo para dizer da dor que me corroi o estômago. É Madalena em sua boca carnuda, suas pernas grossas, seus cabelos longos e enrolados ou sou eu, essa pessoazinha largada nessa cama sentindo uma vontade imensa de morrer. Ou menos que isso, cortar os pulsos da palavra e dizer basta à esses sonhos juvenis.

O verbo, Madalena, é essa mentira que afofa a nossa cama mais não alimenta o nosso corpo. Ele continua pedindo, implorando algo que não existe e talvez não vá existir. E ai você inventa uns sons, espera a chuva cair e vira criança se molhando na esperança de acreditar que seu primeiro amor seria aquele que te resgataria de todas as tuas culpas.

Você vai gastar o seu verbo, Madalena. Vai dizer todo o alfabeto,  vai recitar a coragem ao ouvido dele... vai dizer para ele o quanto ele pode e vai conseguir... mas ao final, ele consegue. E ele vai embora, porque você Madalena é apenas as asas que Deus deu aos outros... e não a você.

A noite tem esse  poder de te isolar, Madalena e por mais que você chore e lamente com pena de si mesma, isso não vai ter a menor importância. Porque cada suor seu e cada lágrima que você derramou nessa caminhada só interessa a você mesma. Eles nem vão se importar com o rótulo que a vida vai lhe dar...

Nenhuma das tuas lágrimas vai encher o que você tem de fundo.

Eu estou sozinha, Madalena.
E você, sozinha comigo, pode nem achar graça dessa dor que me parte ao meio e me diz o tempo todo que o som da madrugada não é consolo é pesadelo.

Eu não morrer, Madalena. E sei que nem você. Mas as nossas asas nunca nos ensinaram que nós mesmas podíamos voar sozinhas....

Mas de que adianta não é? A noite é vã, a superficialidade ronda as rodas da cidade e nós, Madalena, continuamos esperando o asteroide B612, como crianças que não chegaram a crescer;

sábado, abril 07, 2012

Lua Nua


Quando o carro buzinou em frente do prédio, Madalena pulou da cama. Chega de choro, vamos às ruas. Pegou sua pequena bolsa que no momento estava em poder do poodle que a puxara de cima da cama e mandou beijos para mim fazendo gestos com a mão. - Que horas vem? Gritei. - E eu vou lá saber? Sei lá se o papo é interessante? Ah, deixa eu ir, que meu amigo me espera.

Enquanto ela descia as escadas, prédio de três andares, a ansiedade de Madalena saiu deixando cheiro pelos corredores. Era um cheiro amadeirado. De onde vinha, eu não sabia. Mas abri a porta para deixar que a presença dela ficasse dando voltas de ir e vir. 

Prender Madalena? Só o amor que tinha esse poder. Mesmo assim era temporário.Não se prendia Madalena.  

[não te disse que a gaiola não prende e sim a porta aberta?]

Segui Madalena pelo cheiro. Não temos como nos separar. Ela vai, eu vou junto, como açude que sangra e as águas vão levando tudo que estiver pelo caminho. Eu vou junto, com a enchente que emana de seus poros e nem me seguro nos galhos que esbarro pela frente.

Ontem com o coração apertado, a pressão alta, e a cabeça vazia, eu a acompanhei em seu encontro. Na calçada, um rapaz dentro do carro a esperava. Alto, esguio, de óculos, figura bonita, sorriso largo, pele branquinha... Quando entramos, ele a beijou educadamente no rosto. A mim ele não viu. Só Madalena me sentiria naquele momento.

Queria sair das ruas. Queria ir para o apartamento dele. Talvez ouvir uma boa música, tomar um bom vinho, conversar amenidades. Não era sexo. Nada que fizesse ligação ou menção a isso. Por que os homens sempre acham que levar para casa era a concordância silenciosa de sexo? Não fazia sentido. Madalena só queria fugir em boa companhia. Conversar a noite inteira. Ninguém a esperava em casa. Senão eu, em corpo. 

Pensou em propor mudar o roteiro. Ao invés da pista de dança, o aconchego de quatro paredes. Queria se esparramar no chão de alguma sala, discutir uma peça de teatro. Um filme. Uma música. Viu como andam as pessoas pelas ruas de São Paulo, tão assustadas olhando para os lados. Observou como elas seguram as bolsas? Diferente das que andam no comércio de qualquer cidadezinha do inteiror? Nada. Só a vida, o dia a dia. André, o moço que a esperava no carro, era apenas o seu amigo. Haveria sexo entre amigos? O que temem os homens ao se guardarem das amigas?

Madalena fizera silêncio durante o trajeto, até esbarrarem na entrada da boate. Um lugar aconchegante, meia luz, seguranças na porta, uma moça gentil veio nos receber. André desceu do carro, abriu a porta para Madalena e ficou tonto quando sentiu o seu cheiro. Ela estava linda. Por um momento, André quis esquecer que eram apenas amigos. Bons amigos.
  
Eu me agarrei a ela com medo de ser deixada no banco de trás. Entramos. Carla Bruni cantava quase que sussurrando como música ambiente. Como podia isso? Ia acabar com Madalena. Se ela tomasse um vinho, fragilizada que estava ia pegar mal.

E se ela não se contivesse e beijasse André? E se ele a recusasse? E se pensasse que ela estaria apaixonada? E se no outro dia ele sumisse de vista? E se ele pensasse mal dela? E se ela chorasse quando se embriagasse? E se risse demais, escandalizaria o ambiente? Madalena queria mesmo era o aconchego do seu apartamento. Para chorar, como queria naquela bendita noite. E isso, não implicaria, nem de longe a fazer sexo com André.

Quando o vinho já fizera um certo efeito, vi Madalena sorrir intensamente. Menos mal, poderia chorar, como seria o óbvio pela dor de sentia. Mas ela sorria das reservas do André. Quando ele a chamou para dançar, sob a induções dela, Madalena ajeitou as madeixas sobre os ombros, e dirigiu-se ao salão do dancing desejando ardentemente que fosse ele, o seu amor do Rio.

A música a conduzia, como pluma nos braços de André. E ele se permitiu, ao menos aquela noite, ser daquela mulher, em corpo, amizade, e coração. Porque de Madalena seria difícil fugir estando ela envolvida nas teias do vinho e da sedução. Que importava o dia de amanhã, se o vinho era bom e não prometia mal estar?

sexta-feira, março 30, 2012

Anjo



E todos dos dias, entre uma guerra e outra, soletro o seu nome para nunca esquecer de mim. Um dia essa dor acaba, essa lágrima seca e essa falta se enche da tua presença em mim.

Saudade, anjo. Cada palavra sua, cada toque, cada aparição repentina e do nada me inspira, me renova e renova em mim as suas penas. 

terça-feira, março 27, 2012

e quando você vier...



a fome é o avesso do homem e o que me consome toda vez que penso em você. É entrar por uma porta, sair pela janela, pintar o quadro sobre a paisagem morta e ver você em 3D.  Eu sinto fomes, quase insuportáveis de dizer. Dessas que as pessoas não compreenderiam e achariam um absurdo, mas cada vez que fecho os olhos é a tua pele que se desenha o seu olhar sobre o meu. Pele de umidades e de desejos.

sim, eu tenho a fome de todo o dia, a hipocrisia de não dizer abertamente que eu o amo. Assim, meu amigo, aberto o livro em que escondo de ti a palavra vida soprada na minha cara com um gosto de chocolate que arde entre os meus punhos...

[é a tua mão que arde entre a minha, é a tua pele que escorre entre os meus dentes, é a tua falta que escreve em mim a tua poesia]

e eu te desenho em branco e preto, com a esperança de que um dia, a cor da minha voz seja a tua melodia e a minha falta seja o que te escreve fome nas tuas entranhas.
porque tudo em mim é você e o que me falta ainda tem a tua assinatura em branco de detalhes. 

a minha mão repousa sobre a tua ausência e cobre as tuas asas que se espalmam em mim. tu és o q me falta e a rua fica mais larga quando a tua palavra cala e some entre as entrelinhas.

o que me sobra é o que tu calas. e quando vens, eu respingo em festa e tudo em mim acorda e sonha.

Dira Vieira

sábado, março 03, 2012

segunda-feira, fevereiro 27, 2012

A visão do início


 

Um anjo bateu em minhas asas, tocou uma música suave, lambeu minhas feridas abertas, num amor escatologicamente meigo e disse, levanta, abre as portas, que o amor só merece o amor, e a vida que escorre em lágrimas pelos teus olhos, ainda verá grande luz após as montanhas da tua tristeza. E eu, cambaleante, olhei para trás e não te vi. E por pouco não virei estátua de sal. E o anjo, segurando a minha mão, fez-me respirar fundo, como se a suportar a visão dos tempos que viriam a acontecer, colocou-me sobre a Pedra de uma rocha e disse: olha, o essencial, virá das nuvens, nos azuis que tanto esperas e trarão a verdade, a maturidade e a consciência de que tu és, apesar de todas as coisas. E eu te amo. E tu me és. Porque te sei. E nada mais importa.


Estendeu as mãos para outra direção de onde vi um grande mar se abrir, surgindo no meio uma grande mãe de tetas fartas, que me disse, vem. E ela era poesia concreta, e dos seus seios saiam palavras de vida que escorriam como se fossem água saindo de uma mangueira. 


E eu ainda olhei para o anjo e ele tinha a voz de Madalena. Ele que é ela...me tomou nos braços, enquanto eu me desfazia em ondas, e acalentou-me, mostrando-me as pérolas no meu peito e dizendo, não solte-as aos porcos. Fechou minha mão como em concha e abarcou meu coração e me deu fôlego novo.


Mais suave, procurando um chão para pousar. Imaginei que o amor perdoa, e tem os olhos cegos para os erros dos outros, mas o ódio mata e esse, o anjo apertava entre as mãos como um raio e sacudia-o para o fundo do mar. Eis que repente, vejo um dragão lindo sair de dentro das águas e curvar-se diante de mim, oferecendo-me os ombros, pegando dos meus ombros todo o peso, e a indiferença dos dias. Com uma voz de um pássaro, ele me disse, vem. E eu me senti subir sobre as suas costas e já não era eu, mas um soneto de encantamento que terminava o seu ciclo e via-se naquele que foi, sem deixar marcas.


A dor, que o amor tatuou na pele, o dragão sarou. E eu me vi flutuar, na música que o anjo tocava suavemente. E abri as mãos para receber a vida, enquanto ela ainda estava alí, aberta a mim, louca para tocar a minha boca.


Sorri para ele. E como espelho, o dragão era eu, e o precipício era eu, e os meus medos, os medos dos outros, e o desejo era meu e a vontade de viver era minha e eu não podia passar para ninguém, até que o dragão cortasse as nuvens e me levasse para outra ilha. As vontades eram minhas, e as culpas, o espelho do outro. E o lixo já não era, já que a liberdade se moldava em mim.


Quando voltei à terra. Não vi ninguém chorando sobre o meu túmulo, nem amigos, nem inimigos. Mas vi o anjo, sorrindo, me entregando um livro, onde dizia que o verdadeiro amor fecha os olhos e mergulha. E eu amei o anjo, mas amei a mim mesma, pela capacidade de flutuar quando a dor suplanta a vida.


Não precisei dizer-me partir, porque eles estavam alí, sem que eu precisasse pedir. Dos meus olhos que olhavam o nada, e dos meus desertos completamente dispersos, revi uma poesia seca e não quis mais chorar.


(Quisera eu, nunca lamentar um amigo ido. O que é fato, nunca vai, sem nunca ter sido. Porque eles se vão, quando nossas faltas ferem o seu coração e os deixamos sozinhos. Caminho sobre ossos secos que me esperam no sopro, na simplicidade de dar, sem nunca se importar com o que vem depois. Com o amor, eu fecho os olhos e pulo. Nunca mais a metade será apenas eu. E a falta como sombra que me assusta. Quero ser plena e parir os sons de um quilombo de mim).


O anjo estava alí na praia, enquanto o dragão me deixou. E ele se foi, deixando o seu coração a pulsar na minha mão, guardado em concha. E o anjo se foi, deixando-me suas asas para que eu voasse além das dores. E eu adormeci feliz como a que pariu distância e sobreviveu a elas. 


O amor me trouxe de volta, o amor pelo amor, me devolveu as falas e preencheu minhas faltas e ele já não era comigo. E nem assim eu morri, porque já me bastava o só".


Dira Vieira.

quarta-feira, fevereiro 22, 2012

O amor soletra saudade e chora


Tinha a impressão de ter visto o anjo ali, quando fechei os olhos para chorar. Sim, podia ser ele. Senti quando um vento tomou-me por surpresa e me tocou as costas. Ele. E a minha dor fez a canção que eu tinha de melhor, verbo entalando na garganta como um grito de socorro.

Não poderia dizer para mais ninguém o que só ele poderia entender. Como essa música... um aboio que se canta sozinho, na varanda de casa, de frente ao portão quando todas as pessoas já foram embora. 

E nada que me acene capta em mim essa ausência. E nada que eu tome pode medicar a saudade. Essa coisa estranha que é se sentir pela metade quando nunca se foi um inteiro. 

Só sei que a tua boca tem a exata dimensão da volta e da minha. O peito se aperta enquanto os olhos desenham uma estrada de silêncio até o teu coração. Estrada sem volta...

Eis-me domando os ventos e orquestrando o silêncio dos dias em que passo sem ouvir, ver, tocar, falar , sonhar contigo. 

E qualquer conselho, e qualquer ordem e qualquer fala estranha pode sim não entende que as dores permanentes, as dores agudas misturadas não pintam quadros, nem desenham paisagens mas nos afogam em imensas ordens de sossega, sossega, coração. Eu sou a luta de levantar e seguir e outra luta de esperar e esperar...

Sim. Era ele, quando fechei os olhos para chorar, porque todos os dias derramo as tempestades sobre o caminho que ele fez enquanto voou para que os meus rios o tragam, mesmo que nem seja uma volta, mas outro encontro que me deixe navegar por ele... por seu corpo, por sua pele, por suas mãos e sua voz firme que me grita: levante, levante daí, porque é a sua boca em que eu vim mergulhar, como quem toca a fonte de sua emoção.

Eu gritei. E ele ouviu. Mas cansou de ser anjo, pois queria ser pássaro gente também.

Dira Vieira

domingo, fevereiro 19, 2012

Não me importo


...de esperar todas as noites, até que você venha aqui. 

sábado, fevereiro 18, 2012

sexta-feira, fevereiro 17, 2012

se essa rua...



em mim
fiz estrada de pouso para o teu corpo 
fluir


deite-se sobre mim
sou tua estrada
e a marca
da minha fome 
saciada.


não há em mim outra
fala
e nem 
língua 
que se cale


eu sou
silêncio
e
asas
abertas


se a minha boca
fosse minha
mandava
fazer barulho e festa
na tua presença.


se essa rua, se essa rua...


e a minha amplidão soletra o teu nome
o dia inteiro.


dira vieira

quinta-feira, fevereiro 16, 2012

Emocional






As vezes não tem jeito. O tempo fecha. O dia finda. E você percebe que por mais que tenha preenchido as suas fugas, o espaço dele ainda está ali, em vácuos de permanência latente.


Em mim, as esperas cansam e os lábios secam de tanto lamber a palavra cria. 


Essa falta que me arde, tem a estatura e a dimensão da sensibilidade do homem que veste asas e desfila amor em minha companhia.

Dira

quinta-feira, fevereiro 09, 2012

Ali no longe



E toda vez que sofro, sou você. E toda vez que me reviro no viver, sou eu. Mas todas as vezes que pensar cheiros, seu nome é o que pinto em lilás na minha saudade sobre todas as coisas que recrio.

(quando te vejo o meu azul veste a tua pele e sai nu por ai)

Ali, naquele lugar onde o abismo era a tua palavra, deixei para sempre os meus pés na calçada, porque o que é de mim, vem atrás, e o que não me pertence desce a rua e dobra a esquina para nunca mais. 

O que conto de nós é essa saudade e cartas escritas no imaginário profanando sonhos, promessas de luas cheias e verbos conjugados.

Chegamos tarde em todas as vidas e ali, o retrato da família se expande em um letreiro em neon. Lar, doce lar é o aviso de cão feroz no quintal. E o meu olhar se despede e volta, com a covardia da sobrevivência a calçar as asas que se atrofiam diante da impossibilidade do beijo.

... toda a vez que acender o batom como cigarro em uma noite insone, lembrarei o beijo que fiquei devendo ao senhor do tempo e do mar. 

O meu amor, esse, abriu as asas e se escondeu de mim.

Dira Vieira 

Gomos de saudade




Alguns pedaços em Madalena são como gomos de uma laranja, onde o suco escorre como se o mundo fosse um espremedor agressivo e impiedoso. E é. Ela deixa escorrer o medo e se desfaz em voltas que as rimas formam em sua cabeça – há ventos no céu da boca quase insuportáveis de administrar, ela comanda os próprios furacões e nada posso fazer aqui de fora, já que todas as suas falas pronunciam o nome dele. Anda sozinha, sorri sozinha e as vezes até é monstro sozinha: cada passo é em falso e um precipício chamando o outro, conta estórias que não quer esquecer. Não pode reativar os laços porque na verdade, tudo nela é o contrário e desliza desejos, mas se inspira na falta e a palavra dele é cântaro suave naquela janela. Gosta de ler o moço quando a saudade é poesia concreta ardendo na boca.

Madalena cansa das escolhas que faz e mete o verbo no chão com medo do que é possível, como se isso fosse cacos de idéias e relatos de uma paixão. Todas as palavras se ressentem da inspiração que só ele lhe sussurra. (E quando voava ao lado dele, nunca a inspiração foi tão farta e a alma tão leve nas promessas dos beijos futuros).

Ela finge que nem lembra, mas cada vez que olha, o atrás é seu espelho e pesadelo. A boca dele em concha é o alimento tátil e a sua prestação mais sofrida. Quando o amor resseca na boca, é necessário antibióticos fortíssimos para sarar as ausências. Não sei como sobreviveu sem estrelas até agora. 

Quando caminha, a volta é o frio e todas as portas traduzem gritos, quem é ela para compor o intervalo e pedir que ele olhe o retrovisor? O que sinte já nem faz eco, e a letra que soletra já não escreve o nome dele porque esqueceu de suas vogais. Uma lacuna e um verso não escrito, milhas e milhas de rimas que tentou compor e era cara aquela falta. 

Há curvas no tempo e todas as vezes que tenta, o soneto é tempo no verbo passado, que bem podia ser perfeito. 

(Uma roda de amigos, conversas ao vento, o pensamento nela, e o moço sentado na frente da televisão compunha uma novela que nunca teria final, muito menos feliz. Esqueceu que não sabia inglês, e o The End ficou sem eco, pixado no muro em frente ao hotel). 

Madalena se ressente do que não viveu e a sua alma soletra a poesia rota que o tempo atropelou e marcou a carne viva.

Toda vez que canta pensa no ontem. E cada vez que grita, as paredes de sua pele reeditam o dia em que, o que não volta, faz sombra pela eternidade. Nunca esquecerá que no abraço descobriu outros mundos e outras paisagens invisíveis. E isso será imputado em sua culpa para o sempre. E o presente dado, não pode ser devolvido, porque já pertence ao cenário do pesadelo.

Prefere as cenas, reescreve os diálogos: toda a falha é síntese que ela não consegue reemprimir páginas arrancadas bruscamente de si. O livro é antigo, e a história sempre começa pelo fim sem direito a reprise de inconseqüências. Ainda bem que o beijo quando nunca, repete-se no final.

Madalena tem sonhos em vantagem e toda intenção é o receituário de escolhas. Sabe o que faz todas as vezes que volta. E a essa despedida arranha na pele como viagem sem volta – o bilhete é só de ida e o destino, incerto.

- os cachos em seu cabelo são como maçãs desse rubor facial. liga o play e tudo lhe revira o estômago e vomita o morno.

Em todos os dias em que não se desenha na fita, Madalena é angústias de uma alegria passada. Não se pode condenar o tempo por promessas não pagas. 

quarta-feira, fevereiro 01, 2012

Campo de pouso



Ele me calou com o dedo molhado de café em minha boca. Não dissemos uma palavra. Não havia mais nenhuma para ser dita. Tudo estava como deveria estar desde o primeiro dia. Não há o que se esperar da covardia das pessoas. Eu sempre tive a sorte (ou não) de ter covardes para o jantar.

Aquilo não foi uma despedida. Aquilo nem sequer era alguma coisa que se pudesse contar em alguma história de amor. O moço dobrou a esquina e sei que sofria. Mas em mim a covardia dele era um prato amargo de se consumir.

Eu quis gritar. Quis ir atrás, implorar, acho que metade de mim foi com ele e ainda assim, eu quis ir por completo. Mas era pouco o que eu sentia para ir com ele  naquela aventura de silêncios.

A dor era tão grande que chegava a desenhar vulcões em erupção sobre a minha pele. Pele de dores e de desencantamento. Vi tudo o que estava por trás como se fosse a mim revelado toda a farsa da covardia.

Eu chorei. E morri os dias seguintes até que conseguisse sepultar todos os meus mortos e as minhas lágrimas amargas e tão desnecessárias. Mas sou assim mesmo... o tempo de luto é o tempo de recompor meus limites.

Quando o dia amanhecer após uma noite longa de choro e de dor... eu ainda estava ali, esperando por ele, o mesmo moço que morava em mim, mesmo depois de ter tentado colorir outra cor, onde a pele dele era a minha tatuagem perfeita em minha alma e pele.

E todos os dias, alimento a partida, como único recurso para chamar para mim a parte que foi e que me faz falta quando espero os dias úmidos em minhas entranhas para agasalhar o frio de alimentar sonhos... antes que a parte que me cabe também vá em homenagem a ele. 

Dira.

segunda-feira, janeiro 30, 2012

Plantando chuvas...




É quase certo que ele saiba o sentimento que me povoa a pele. Sinto isso quando olho sempre para os lados e posso sentir a sua respiração perto. Respiração de quem ama, mas não vem.

O dia me chamou para uma conversa séria e eu chorei. Sabia que as lágrimas não cessariam enquanto os pedaços cortados em atitudes não fossem rejuntados. Me fiz rio e mais que um simples choro, tornei-me um vendaval incontrolado de dor. Uma dor quase insuportável que me fez vários fragmentos de vontades e decepção.

Eu me inundo. E faz tempo que não me banho nessas águas de dores porque tenho aprendido a domesticá-las e mantê-las longe onde não causem danos... tenho aprendido a ler a lua, a entender as marés e a soltar o barco à sua própria sorte. Mas viver é esse risco de embate e de contradições.  

E hoje, essencialmente hoje, rios sufocam a minha pele e escorrem pelas ruas onde tudo o que leio é o que falta nesse mar. Tenho em mim que a respiração ofegante dele a qualquer momento vai me pedir para ficar e eu vou continuar plantando as chuvas de uma alegria quase impar de se ver.

Não vou fotografar meu riso quanto tantas vezes fotografei a dor. Que a minha alegria de ventos seja para sempre guardada nas fendas das montanhas longe de todo olhar que me afaste dele. Tenho em mim a ausência da alegria e parece que o tempo não vai parar por causa disso.

Abro os braços enquanto solto a direção na estrada. Nem sou anjo, nem piloto ventanias, mas o que tenho isso espero, a minha voz em protesto e o meu amor como casaco de pele.

Eu espero, plantando as chuvas como quem calça chinelos. 

- Deixo para ele as "reticências de Deus".

domingo, janeiro 29, 2012

Bomdiadomingo



O dia me assalta, me joga da cama contando estorinhas para boi dormir. Mas eu já acordei. E a cama quentinha é apenas uma imagem na lembrança.

Vamos ao mar e a minha esperança se rende em família.

Que venha o sol.

sexta-feira, janeiro 27, 2012

Casulas comigo?

Wings of Desire, fotografia de Michael Matlach, 1989. EUA.


abri as mãos como se fosse possível encontrá-lo dentro delas. mãos úmidas de esperança, o coração que soletra seu nome e a vontade de adivinhar-lhe as asas.


trago a boca ainda ávida de sua voz como se a sua pele fosse posta em mim como uma tatuagem antiga. era você em mim desde o princípio e tudo o mais que se fizer palavra depois disso se tornou uma repetição de parágrafos, esperas úmidas.


a minha voz embargada dos dias que acordam longe de você tem o momento exato da falta de sua pele na voz rouca que sussurra o seu nome...


abri meu corpo para procurar você e me encontrei debaixo de suas asas. 

quinta-feira, janeiro 26, 2012

Herança






Porque em mim o que de ontem e hoje vira fim de festa em meu estômago, desenha os vácuos em transparências de suas faltas. 

Se você não vem eu me embrulho e seco pois sou como as aves e as folhas largadas de suas peles...

em mim, o que restou é pele molhada sobre mim.

Dira

terça-feira, janeiro 24, 2012

Dupla Face


Lagoa em dia de chuva, alagamento à vista.
Foto de Josivandro Avelar - http://www.josivandroavelar.com


a chuva lá fora não
molha
o dentro
que minha alma suporta


é você
corpo de esperas
promessa

ardendo em mim


palavra
em contra mão
contra
senso
contra
falta


o que tenho
é um coração


ardendo
em favor
e contra


esse verbo
que me conjuga
não resolve
encantamentos


estou só
e junto
até que o muito
se prove em contrário.


(dira vieira)