Tire-me pra dançar, anjo
deixei a voz presa enquanto pensava o teu nome. era um
pássaro com asa dentro da minha blusa enquanto balbuciava a esperança. os seus
dedos em penas sobrevoavam a minha pele de fêmea, mas era Madalena quem
suspirava e não eu, que a tudo resistia melancolicamente. não podia voltar
àquele tempo em que fui tua. a menina doce, a mulher afoita e a Madalena que
adormecia silenciosamente entre as tuas asas.
enquanto falavas no altar, a menina sonhava e enrubescia
com a memória de silêncio e de odores que se faziam asas em páginas e páginas
em que te escrevia como em gritos.
não volto mais ao portão e o cachorro que latia quando a
noite se tornava tarde, agora jaz em alguma lembrança minha ou sua. não
resolvemos ainda essa parte da vida?
Madalena levantou após a fala, mas não tinha o rubor
facial que merecia aquela memória, ao contrário, ardia em pêlos e sentia a tua
pele levantar a alma da menina que guardava em si, e isso era pecado mortal.
(eu tenho
medo de tuas dúvidas, porque tenho medo de te perder...
não
brinca de achar o que estou pensando ou o que não estou, porque em mim, as únicas
fogueiras que queimam é as de uma inquisição particular e íntima).
e mesmo que o meu amor seja bem maior que o seu, a fala é a
minha retirada de cena, quando o que me resta é arrumar as malas dentro de nós
e pegar a estrada antes que a noite me desnude.
sufoco em mim o rubor facial quando o teu olhar me tira a pele e me chama para dançar, assim, completamente à luz, aos olhos dos que não entenderão nunca o que acontece quando as almas dizem sim.